José Quaresma
Reconfiguração simbólica e artística da realidade humana numa “Tabanka”
A série de registos fotográficos que temos a oportunidade de observar em Pooja Magma, interpela-nos com uma força simultaneamente plástica e antropológica, constituindo um conjunto de obras de rara frescura e autenticidade. Contudo, só por si, esta indicação pouco ou nada adianta às fotografias exibidas, se não nos detivermos na especificidade do envolvimento estético e humano da autora em relação às pessoas e lugares focalizados.
Na obra A Luta pelo Reconhecimento de Axel Honneth (autor contemporâneo dos domínios da filosofia e antropologia social), deparamo-nos com três possibilidades motivadoras da reivindicação de «confiança em si» (1), «respeito por si» (2), e «estima de si» (3), uma vez transgredidas pelo outro, individual ou colectivo, no sentido de retirar ou diminuir liberdade para agir de um sujeito ou comunidade nas três dimensões acima apresentadas. A primeira reivindicação é despoletada quando a integralidade física e moral de uma pessoa sai diminuída de uma determinada interacção; a segunda, quando se verifica uma desconsideração pelos direitos cívicos elementares de um sujeito ou comunidade; a terceira, quando a qualidade e a capacidade de um indivíduo ou conjunto de indivíduos para criar, pensar, ou produzir juízos sobre a realidade, é desconsiderada por via de um propósito externo de iniquidade, preconceito, ou outro procedimento dito de instrumentalizador (à luz da classificação habermasiana, uma “acção teleológica e instrumental”).
Nas composições fotográficas de Ana Telhado, para além da beleza estética das propostas que nos apresenta (a força emergente dos personagens, a limpidez do Preto e Branco, a flutuação do feminino no horizonte telúrico que as cerca a elas e a nós, entre outras virtualidades tornadas manifestas pela autora), não podemos deixar de considerar, sendo esta uma linha hermenêutico-estética tão legítima como outra qualquer, que as três possibilidades de diminuição da liberdade para agir, enunciadas pelo autor alemão, estão aqui patenteadas esteticamente.
De facto, a nosso ver, esta produção fotográfica como que se ergue à maneira de uma ponte que nos coloca numa atitude de contempladores tensos de uma reconfiguração simbólica daquele mundo (Tabanka) experienciado de muito perto, durante três meses, pela Ana Telhado, sendo que a «Luta pelo reconhecimento» se recobre de qualidades plásticas tendentes a tornar ainda mais visível a condição do feminino, a condição de uma cultura exteriormente eclipsada, da frágil subsistência, ou outras.
Lisboa, 16 de Outubro de 2009
José Quaresma